Tudo na minha vida tem a ver com o antes e o depois deste dia de Abril de 1968.
E assim começou uma história de AMOR com muitos episódios
Lisboa, fim de Abril 1968. ‘Ainda és virgem?!’ O olhar quase incrédulo para o sangue na cama. Quando me foste buscar ao ISLA pensei que ia resolver dois problemas. Deixar de ser virgem e deixares de andar atrás de mim. Há meses que, na família, as tuas indirectas sobre ‘fazer amor’ fizeram com que quisesse mais do que os beijinhos e pouco mais dos namorados da minha idade.
No Fiat descapotável a caminho da casa na Praia das Maçãs, estava mais ansiosa que nervosa. Mal almocei. Sei que era marisco. Bebi um pouco a mais do Planalto. Em casa junto à lareira da sala ainda bebi um pouco do teu whisky. No fim, encostada no teu peito fumei também um Marlboro. ‘Vai buscar um saco lá abaixo’. Já tinhas feito a cama. ‘Levo o lençol para a agência, a cozinheira trata disso.’
Na volta a Lisboa ‘Foi tudo rápido. Mas gostaste?’ O ‘nem por isso’ mais para magoar o teu ego. ‘Da próxima é melhor, vais ver’. Aos 18 anos achava que estava a ser esperta, ia ser uma única vez e pronto. Com mais 30 anos, estavas divertido. ‘Que bom, vou-te ensinar tudo’.
Vamos e@Vaginar o que era a vida no fim dos anos 60?
Saí de Portugal pela 1ª vez aos 16 anos. Tive de ir à PIDE carimbar o passaporte. Fui à Suécia para a minha Mãe ser operada a um aneurisma cerebral. Só há pouco pelas cartas que encontrei percebi que essa viagem tinha sido só de umas semanas. Tão intenso, senti como dois meses. Ir de ambulância do Hospital Egas Moniz para o aeroporto. Em Gotemburgo já de noite o médico (o único português no hospital) estava à nossa espera: ‘Pelos exames pensámos que estava pior.’ A meio do check-up, a Mãe ‘Não, não tenho tido tonturas.’ Abre-se a porta ‘Agora estou a ter uma’. Um homem lindo de morrer, louro, alto, de olho azul a perguntar algo em sueco. De bata branca, estetoscópio e de socas. Ficou intrigado quando os três desatámos a rir.
Saída da missa na igreja de S. Mamede ‘Vais à Suécia? Tens de ir ver filmes pornográficos! Lá passa no cinema’. Depois dos médicos fazerem a ronda e dizerem que estava tudo bem com a Mãe, lá ia a correr para a matiné. O melhor espectáculo era na plateia – os pares de miúdos enfiavam-se por baixo das mantas e era uma festa barulhenta. Os filmes eram um bocado monótonos, sem história. Uma vez fiquei muito confusa: os personagens eram dois irmãos que vinham da escola de uniforme, um rapaz e uma rapariga, mais tarde chegavam os pais e acabavam todos na sauna em casa.
Os médicos e enfermeiras acharam-me muita graça e já partilhava com eles os ‘coffee-breaks’. Um dia ‘Quando deixaste de ser virgem?’ Eu mal queria acreditar nas gargalhadas quando disse que ainda era. ‘Aos 16 anos?!’ Corei meia ofendida quando um dos médicos se prontificou a fazer-me o exame. O médico português a explicar que no nosso País era normal, que se começava tarde a vida sexual.
Percebi que as enfermeiras falavam muito excitadas sobre um homem. Um dia chamam-me a correr. Vejo um negro alto, gingão e risonho a descer o corredor. Aquele enfermeiro era o sex-symbol?
Lembram-se do médico lindo de morrer que deu a tontura à Mãe? Esse sueco no dia de Natal convidou-me para ir jantar com a família. Uma casa de madeira muito quentinha, muita neve à volta. A mãe dele tinha feito bacalhau especialmente para mim. Fresco, com um molho de menta, branco e horrível. Um vinho branco doce, uma única garrafa para 4 pessoas. Muito curiosos sobre Portugal, tantas perguntas sobre política e a guerra em África. Ali parecia tão ridículo o meu irmão ter de atravessar para o outro lado da rua por que a 100 metros do liceu uma rapariga não podia ir acompanhada por um rapaz; a Mãe me ter dado um alfinete de d’ama para afastar os gajos no autocarro. Quando sozinhos no Volvo me levou de volta ainda fiquei à espera de um beijo, de uma mão na perna. Nada. E a Mãe a querer saber como era a casa, como foi o jantar, como estavam vestidos ‘ah, o médico é solteiro’. Eu distraída: nada. Nem um beijo na cara. Só à porta do hospital um sorriso e um adeus de dentro do carro.
Nas noites a seguir à cirurgia um aluno de medicina ficava no nosso quarto a vigiar – sabia francês se fosse preciso falar com a minha Mãe, sem me acordarem. Convidou-me para passar o fim do ano com um grupo de amigos. Um apartamento perto do hospital, poucos móveis, tudo muito claro. Todos estudantes universitários. Foi uma noite de surpresas. Ninguém mais velho. A comida era sandes de metro na cozinha onde íamos cortar um bocado, pratos e copos de papel. Fizeram uma festa às duas garrafas de tinto português. Foi a 1ª vez que vi um charro. Enquanto que em Portugal fazíamos ‘marmelada’ às escondidas, ali por todo o lado havia pares de eles/elas, eles/eles. Foi a 1ª vez que vi duas raparigas a se beijarem. Passava da uma quando me levaram de volta ao hospital, as Urgências estavam cheias de pessoas – homens e mulheres bêbados. Muito diferente de Portugal.