No livro ‘Lisboa 60’ Joana Stichini Vilela dedica a página 128 à agência de publicidade Êxito. Imaginam eu com 16-17 anos vivenciar toda esta experiência?
Fiquei fascinada por conhecer em casa do Fernando na Quinta das Mouras Álvaro Belo Marques, Ruella Ramos, Jorge Galveias Rodrigues, Luis Lagrifa, Raul Solnado, Artur Agostinho e as respectivas famílias. E na agência conviver com Alves Redol, Ary dos Santos, Cardoso Pires, Alexandre O’Neill, Sttau Monteiro, Baptista Bastos, Fernando Lopes, António Pedro Vasconcelos, etc.
Coleccionava religiosamente os LP’s dos cantores e grupos de Inglaterra e dos EUA. Durante meses andavas a falar sobre a revolução sexual, a dar-me para ler jornais e revistas estrangeiros. O tema passou a ser discutido à mesa, nas longas e animadas noitadas em tua casa. Com amigos e em família.
Com mais 30 anos, achava-te ‘velho’. A tua conversa era interessante. Fazia troça por gostares de andar de óculos escuros em locais fechados, restaurantes, etc. Aprendi a gostar de whisky e de fumar SG.
Quando fiz 18 anos e o meu Pai me emancipou achei divertido apertares o cerco. Só que as tuas indirectas de ‘fazer amor’ fizeram com que quisesse mais do que os beijinhos dos namorados da minha idade.
Tudo na minha vida tem a ver com o antes e o depois desse dia no fim de Abril de 1968. Quando me foste buscar ao ISLA pensei que ia resolver dois problemas. Deixar de ser virgem e deixares de andar atrás de mim.
No Fiat descapotável a caminho na Praia das Maçãs, estava mais ansiosa que nervosa. Mal almocei. Sei que era marisco. Bebi um pouco demais do Planalto. Em casa junto à lareira da sala ainda bebi um pouco do teu whisky. ‘Ainda és virgem?!’ O olhar quase incrédulo para o sangue na cama. No fim, encostada no teu peito fumei também um Marlboro. ‘Vai buscar um saco lá abaixo’. Já tinhas feito a cama. ‘Levo o lençol para a agência, a cozinheira trata disso.’
No regresso a Lisboa ‘Foi tudo rápido. Mas gostaste?’ O ‘Nem por isso’ mais para magoar o teu ego. ‘Da próxima é melhor, vais ver’. Aos 18 anos achava que estava a ser esperta, ia ser uma única vez e pronto. Com mais 30 anos, estavas divertido. ‘Que bom, vou-te ensinar tudo’.
Num ano fiz um curso intensivo de sexo. Passou de umas tardes a seguir ao ISLA para ter um estágio na Êxito no Departamento de Meios. O meu chefe foi o José Manuel Picão de Abreu. Tinha saído de Peniche e já estava casado com a Lena Carneiro.
Foi para me controlar ou para ficar mais fácil nos encontrarmos? Ao fim da manhã o telefone interno. Almoço na Gôndola, no Paquito e íamos a Campo de Ourique um par de horas. Ou no fim dum jantar de família, paravas na Ferreira Borges antes de me ir levar a casa na Rodrigo da Fonseca.
Às vezes à tarde ias comigo ao Clube dos Publicitários tomar um copo. Lembro do ar curioso do Ary dos Santos. As suas fúrias na Êxito eram famosas. Um dia o elevador cheio, os accounts a rir sobre a campanha de desodorizante íntimo feminino. ‘Tem com sabor a Carvalho Ribeiro Ferreira?’ Corei quando me olhaste a sorrir.
Nas férias no Algarve esta relação incestuosa era mais complicada. Íamos juntos fazer compras à vila para conseguir uma escapadela. Uma vez na praia ‘Continua, não páres. O cabo de mar e o da GNR estão na duna a olhar’. No fim caminhei bem devagar, nua antes de me vestir.
‘Quando eu morrer vais ao meu funeral?’ ‘Nem morta, para encontrar todas as outras com quem tu andas?’. Motivo de risota. Que cumpri.
Fiquei furiosa quando convidaste a minha amiga São para ir passar um fim de semana contigo ao Porto. ‘Podíamos ter estado os três juntos’. ‘Já andaste com ela?’ ‘Ainda nunca estive com uma mulher’. ‘Nem pensar!’. Afinal eras possessivo.
Meu Deus, uma narrativa desempoeirada, sem bafio...Mesmo a cheirar ao Maio de 68 em que a Libertação era mote para a vida...Obrigada! Adorei!